``Que tipo de afeto é esse que não se traduz no respeito aos direitos?``. A pergunta de Ana Carolina Querino, representante interina da ONU Mulheres Brasil, foi uma das reflexões do encontro Trabalhadoras domésticas em cena: direitos e desafios, realizado pelo Consulado do México no Rio de Janeiro, Fundo ELAS e ONU Mulheres na última segunda-feira, dia 29, em comemoração ao Dia Nacional daTrabalhadora Doméstica.
O evento contou com uma mesa de debates com Nair Jane Lima, Creuza Oliveira e Cleide Pinto, ativistas e defensoras dos direitos das trabalhadoras domésticas no Brasil, Ana Carolina Querino (ONU Mulheres Brasil) e o crítico de cinema Maurício de Bragança.
``O Dia da Trabalhadora Doméstica não se comemora: é uma data de luta. Uma luta por resistência. Se formos falar dos 80 anos de organização das trabalhadoras domésticas no Brasil, muita coisa mudou``, disse Creuza Oliveira, secretária geral da Fenatrad (Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas). ``A PEC foi uma questão de reparação a uma categoria que formada por mulheres, e mulheres negras, e essa categoria garante saúde, educação, limpeza , bem estar e repõe a força de trabalho das/os outras/os trabalhadoras/es que saem para trabalhar e deixam sua casa sob responsabilidade``, destacou Creuza Oliveira.
``Nossos direitos são colchas de retalhos, porque vêm sempre aos pouquinhos, sempre aos pedacinhos. Temos que sempre resistir, nunca podemos deitar a cabeça no travesseiro e dizer ah, que bom, amanhã a gente já não vai ter problemas, amanhã a doméstica que for trabalhar pela primeira vez em uma casa vai ter sua carteira assinada, seus direitos respeitados, um salário digno ``, disse Nair Jane Lima, que é trabalhadora doméstica desde os nove anos de idade e luta pela organização da categoria desde 1970. Atualmente Nair Jane é vice-presidenta do Sindicato de Trabalhadores Domésticos de Nova Iguaçu, de que foi uma das fundadoras.
Apesar de terem conquistado avanços importantes, como a PEC 150/2015, conhecida como PEC das Domésticas, ainda há muito a percorrer pela efetivação dos direitos das trabalhadoras domésticas, que somam mais de 7 milhões de brasileiras, em sua maioria mulheres negras. ``O pico de formalização das trabalhadoras domésticas foi de 35%, apenas. Ainda falta a efetivação da PEC das Domésticas``, disse Ana Carolina Querino.
Cleide Pinto, presidenta do Sindicato de Trabalhadores Domésticos de Nova Iguaçu, compartilhou como vem sendo a luta da categoria por direitos: ``Fazemos muitas oficinas procurando fazer os sindicatos crescerem, a gente tem que se fortalecer. Reunir os trabalhadores na fábrica é fácil, mas reunir trabalhadoras domésticas é difícil porque cada uma trabalha em um lugar. É trabalho de formiguinha. E nossa meta é nos unir nacionalmente - esse é o papel da Fenatrad``.
O crítico de cinema Mauricio de Bragança traçou um paralelo entre a situação compartilhada pelas trabalhadoras e o filme Roma. Vencedor do Oscar 2019 de melhor direção, melhor fotografia e melhor filme de língua estrangeira, Roma é uma autobiografia do diretor mexicano Alfonso Cuarón e retrata a rotina de uma família na Cidade do México em 1970, acompanhada silenciosamente por uma mulher (Yalitza Aparicio), que trabalha como babá e trabalhadora doméstica.
``Era comum vermos uma representação desqualificada das trabalhadoras domésticas no cinema, na TV - elas estavam sempre no lugar do humor, do escárnio. O que a gente observa hoje no cinema, sobretudo no latinoamericano, é uma mudança nessa representação, que tem a ver com a mobilização das trabalhadoras domésticas``, disse o crítico, que é professor do Departamento de Cinema e Vídeo o do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFF.
Mais de 50 pessoas participaram do evento e, após o debate, assistiram ao filme Roma - com direito a pipoca e refrigerante.
Saiba mais sobre a luta das trabalhadoras domésticas por direitos.