Foram 31 projetos apoiados pelo Fundo Fale sem Medo numa parceria inédita que contemplou 13 estados do Brasil, em diferentes áreas de atuação, todos tendo como foco o fim da violência doméstica.
Abaixo três entrevistas de ativistas importantes, envolvidas em projetos desenvolvidos pelo Fundo ELAS em parceira com o Instituto Avon (Fundo Fale Sem Medo), Fundação Ford e ONU. São exemplos do quanto nossas parcerias são importantes e podem mover o mundo à nossa volta.
Fundo Fale sem Medo = Fundo Elas + Instituto Avon
Festival Roque Pense!
Giordana Moreira – Coordenadora
ELAS - Qual a importância do festival para a cultura local, a região e para as mulheres?
Roque Pense (Circuito Rock de Bandas com Mulheres na Baixada): Na Baixada Fluminense a cultura não é encarada como importante para o desenvolvimento humano, pelo contrário, é quase tida como um privilégio, tanto no acesso como na produção. O estigma de região violenta e miserável faz com que a mídia e as pessoas reforcem a ideia de que aqui nada é bom, de qualidade, tanto para consumir como para produzir. Somado a isso o rock é marginalizado, muito diferente da capital, o Rio. Portanto um festival desse porte é um desafio e uma afirmação para produtores, artistas e publico, para provar que sabemos fazer com qualidade e responsabilidade e que os sonhos da juventude devem ser respeitados.
Também tem o fato de que o festival foi criado para acontecer em praça publica, para desconstruir essa marginalização do rock na Baixada, local em que a ocupação do espaço público é um tema de conflito entre os agentes culturais e as autoridades, é significativo. Na Baixada, ocupar o espaço público é muito tenso, não há regulação democrática para essa ocupação, existe uma mentalidade coronelista e o entendimento dos gestores públicos locais é o de cultura como evento. Mantemos um dialogo permanente para garantir nossos direitos, participamos da criação de um fórum, o Recult, e estamos nos movimentos por direitos culturais na região. Realizamos o festival porque somos parte da cena, porque aqui quem faz cultura é a galera da resistência.
Além disso, tem o fato de que o rock e a cultura urbana, em todo o mundo, é
dominada por homens, reflexo da sociedade machista. É um desafio propor a realização de um festival deste tamanho dirigido somente por mulheres. Ainda encontramos resistência nos ambientes de decisão e ignorância sobre o sexismo. É importante construirmos referências, espaços, fazer intercâmbios e abrir canais para debater e enfrentar o sexismo nesse universo da musica e da cultura urbana.
O Roque Pense acontece na região que lidera o ranking de casos de violência no Estado, o atendimento é precário, e a insegurança é crescente com a política das UPPs. Um festival com visibilidade e potência, que reúne mulheres de vários cantos do Brasil, fala de violência em praça publica, na TV e diz que a mulher não é obrigada a sofrer violência, incomoda a alguns, mas também é uma libertação para as mulheres. Ali na plateia e lendo o jornal estão os pais, as autoridades, as pessoas que decidem na metrópole e, assim, elas ficam sabendo que a juventude está posicionada contra uma cultura machista. Garotas de 15 anos encontram o feminismo e os garotos ouvem que elas falam sobre isso, sobre violência e que eles não precisam ser machistas. Isso, ali, num show de rock, que seus pais viram anunciar na TV, é um efeito multiplicador e muito forte na vida das pessoas para o combate ao machismo.
ELAS - Fale de alguns fatos marcantes nesse sentido.
Roque Pense: Chegamos com muito esforço à terceira edição, buscando caminhos para poder garantir a continuidade, e atingir nossas metas, com a colaboração de vários profissionais e coletivos parceiros. Apesar de muitas parcerias o festival demanda uma serie de estruturas que ainda não conquistamos. Ainda não podemos ser do tamanho que temos potencial para alcançar, por falta de recursos. Não é fácil conquistar apoio para iniciativas assumidamente feministas.
Promovemos artistas independentes e com ideias revolucionarias, engajados no movimento por direitos, e buscamos espaços para essas artistas e ideias na mídia e em instituições públicas. Por outro lado, também participam do festival artistas que estão fora do movimento de luta por direitos e muitas vezes é difícil fazer com que todas e todos cheguem ao mesmo tempo à compreensão do posicionamento mais engajado do festival através de seu discurso.
Mas sabemos da importância de tentar o entendimento e trazer à praça publica a questão da liberdade da mulher e de questionamentos inerentes ao tipo de atuação cultural que temos. Se quisermos chegar a quem ainda não está do nosso lado, ou mesmo tem interesses contrários que violam os direitos humanos temos que insistir no convívio da pluralidade.
ELAS - Qual a importância das parcerias com o ELAS e do apoio do Instituto Avon? Como isso poderia ser melhor aproveitado?
Roque Pense: Primeiramente um festival deste porte precisa de uma estrutura que gere visibilidade para as ideias, as artistas. Um palco, um som e uma luz bacana são fundamentais para que elas façam um bom show. É preciso ter um ótimo plano de comunicação, profissionais e material para executá-lo. É preciso que o público saiba que o festival vai rolar, e que o espaço público tenha estrutura segura para recebê-lo. E pessoas dedicadas para isso 24 horas durante um ano inteiro. É preciso recursos financeiros sim. E os apoios do Fundo Elas e do Instituto Avon foram fundamentais para isso. Já havíamos escolhido o tema violência de gênero em 2013, logo após a segunda edição, por conta da divulgação dos dados do Instituto de Segurança Pública que apontava os índices na Baixada. Porém conseguir patrocinadores para um festival de musica com um tema tão pesado não é fácil. As empresas querem publicidade. O edital foi fundamental, pois entendia a urgência em se falar de violência, e em um meio que é muito estigmatizado como alienado ou descompromissado, que é a juventude e o rock. E isso não nos impediu de conseguirmos esse apoio. O Fundo Elas nos deu o maior apoio na orientação quanto ao conteúdo do que queríamos abordar, a nossa participação no Encontro Nacional sobre Violência Doméstica, a consultoria da conselheira Rita Andrea, para a campanha, a recepção rápida e cuidadosa quando precisamos de orientação sobre os próprios conflitos do movimento feminista, nos fortaleceu de uma forma imensurável como coletivo, influenciando de forma a aumentar o impacto de nossas ideias durante o projeto. Sem dúvida foi o maior ganho desta parceria.
Ah! Então Sou Feminista! Vale conferir!
Fundo Elas + Fundação Ford
Clair de Castilhos – Rede Feminista de Saúde
Três Redes e duas Organizações Feministas foram selecionadas no XV Concurso, uma realização do Fundo ELAS em parceria com a Fundação Ford para a Campanha “Ah! Então Sou Feminista”! As cinco selecionadas produziram uma série de materiais, entre eles o Almanaque Feminista, que agora estão disponíveis no hotsite da Campanha, na página do Fundo Elas.
A seleção foi através de carta convite totalizando um investimento direto de U$122.500,00. O principal foco foi a comunicação como ferramenta estratégica de sustentabilidade e fortalecimento do movimento feminista no Brasil, além de ações de gestão e mobilização de recursos. Para falar mais sobre a campanha, Clair de Castilhos da Rede Feminista de Saúde.
Elas: Qual a importância do projeto realizado em parceria com o ELAS e a Fundação Ford?
Rede Feminista de Saúde – Clair Castilhos: O aspecto mais relevante e de grande importância foi a estratégia de produzir uma campanha com materiais que pudessem desmistificar os preconceitos contra o movimento feminista. Por isso a produção de peças leves, descontraídas e que, apesar da leveza não descuidassem do conteúdo teórico e conceitual. Dentro dessa perspectiva a atividade que a Rede Feminista de Saúde se propôs a elaborar foi um Almanaque, de cunho popular, com linguagem direta e muitos jogos e atividades que remetessem à trajetória histórica das lutas, conquistas, avanços e desafios dos feminismos. A ideia foi de informar e divertir.
Elas: Quais têm sido os avanços do feminismo na nova geração?
Rede Feminista de Saúde – Clair Castilhos: O principal avanço do feminismo é que as ideias e lutas do movimento estão gerando uma nova situação da mulher na sociedade. Há o reconhecimento de uma série de direitos que até pouco tempo atrás eram bandeiras do movimento feministas. Hoje esse conjunto de direitos já se constitui num senso comum da sociedade em geral e na nova geração, em especial nos marcos dos direitos humanos. Há de se ressaltar a Lei Maria da Penha, a Legislação das empregadas domésticas, os avanços no mercado de trabalho e o reconhecimento da necessidade de justiça salarial e de acesso e conquistas dos direitos sexuais e reprodutivos e inclusão na Política. Essa nova situação é entendida quase como "natural" pelas novas gerações. Aí é que há necessidade de termos o cuidado, de alertar que a nova realidade foi resultante de muita luta e trabalho das mulheres militantes e que não podemos nos descuidar, pois o retrocesso pode sempre acontecer.
Elas: Algum destaque para o movimento em 2015?
Rede Feminista de Saúde – Clair Castilhos: o destaque do movimento em 2015 deverá ser a definição de novas estratégias de atuação, pois o avanço das forças fundamentalistas e conservadoras no Brasil e no mundo nos colocam frente a uma realidade sinistra, que pode e deve ser superada. Há necessidade de uma análise conjuntural, que nos indique em que momento temos que avançar e quando é necessário recuar e acumular forças. Enfim, a luta continua...
Trabalhadoras Domésticas
Fundo Elas + Fundo de Igualdade de Gênero da ONU
Entrevista com Carli Maria dos Santos, do Sindicato das Trabalhadoras Domésticas do Rio de Janeiro
Reunião no Sindicato
Oito sindicatos de trabalhadoras domésticas e a Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas foram apoiados por uma iniciativa do Fundo Elas com a ONU, em parceria com a Themis Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero, com um investimento de R$ 436.000,00 para projetos com o objetivo de fortalecer entidades da categoria, apoiar a implementação da Convenção 169 da OIT – Organização Internacional do Trabalho - e a nova legislação nacional sobre trabalho doméstico.
Elas: Fale sobre a parceria com o Elas, através do apoio da ONU.
Carli: A parceria com o Fundo ELAS nos permitiu fazer muitas atividades que não nunca tínhamos feito antes. Foi muito importante para nós, pois nos deu permitiu dar mais atenção à instituição. O Sindicato de Trabalhadoras Domésticas é uma instituição sem fins lucrativos, que atende às pessoas da categoria, tem gastos e não tem muito como angariar fundos. Nós trabalhamos muito para levantar recursos para o trabalho com o Sindicato e o apoio do Fundo Elas veio numa hora excelente.
Elas: O que vocês conseguiram objetivamente?
Carli: Hoje conseguimos fazer cursos como de informática e de cuidadora; comprar equipamentos como novos computadores e novos celulares; adquirir novos planos para os celulares que nos permitem mais conexão com as companheiras, inclusive com as da diretoria, porque todas trabalham fora, são domésticas, e precisamos nos falar com frequência e com esse novo plano conseguimos acesso. Isso é muito importante. Esperamos muito que o projeto continue.
Elas: Projetos para 2015
Carli: Para 2015, vamos fazer um encontro regional no Rio, com e com o apoio vamos conseguir pagar a passagem das companheiras de outros municípios e realizar o encontro ouvindo a realidade das domésticas de cada lugar. Sem a ajuda seria impossível trazê-las.
Então, com os recursos do apoio compramos, ainda, um micro-ondas, porque o serviço aqui é voluntário e é necessário que as pessoas que vem trabalhar tenham como fazer ou esquentar sua comida; uma impressora lá para baixo porque a de lá já estava ruim; além de 2 computadores; 2 aparelhos celulares e ainda falta um som para fazer as festas porque faz parte de nosso projeto fazer mais atividades aqui para ajudar a sede que precisa de reformas.